14 de março de 2011

Patrimônio Líquido é Passivo?

A Lei 6.404/76, art. 178, § 2º, diz que “sim”, que o Passivo representa as obrigações da pessoa jurídica, e é composto pelo Passivo Circulante, Passivo Não Circulante e Patrimônio Líquido. Para a Lei, o Patrimônio Líquido faz parte do Passivo por representar obrigações que a pessoa jurídica assumiu ao receber capitais de seus donos, viabilizando, assim, as suas atividades. Isso porque tudo o que temos e que possui liquidez (Ativo) teve como origem recursos de terceiros acrescidos de recursos pertencentes aos donos da pessoa jurídica. É por isso que o Ativo é igual ao Passivo.

O Conselho Federal de Contabilidade, através da Resolução nº 774/94, ratificada pela Resolução nº 1.049/05, alterou a Lei. Para o CFC, o Passivo compreende somente as origens de recursos representadas pelas obrigações para com terceiros; e as obrigações que a pessoa jurídica possui para com os seus sócios ou acionistas, pelo capital de risco, não representam uma obrigação. Por isso, o Conselho excluiu do Passivo esse subgrupo, criando um grupo independente chamado de “Patrimônio Líquido”.

Essa é uma questão conceitual que envolve fundamentos teóricos de Contabilidade. O ideal seria discutir esse assunto, assim como outros da área, nos congressos ou convenções da profissão (citando como exemplo: “A contabilidade internacional é um avanço ou um retrocesso à profissão contábil?”). Como as proposições não são mais discutidas nesses encontros de profissionais, só nos resta escrever sobre os mesmos.

A classificação equivocada de que o Patrimônio Líquido não representa juridicamente uma obrigação se dá por uma interpretação igualmente equivocada, s.m.j, de uma teoria contábil defendida pelo italiano Giovanni Rossi (1845-1921), em sua “Teoria Matemática das Partidas Dobradas”, onde estabelece as equações: Ativo menos Passivo é igual ao Líquido Patrimonial (A – P = N). Para o doutrinador, o “N” representa o “Líquido Patrimonial”, e “Líquido Patrimonial” não era sinônimo de “Patrimônio Líquido”, e, sim, “Resultado do Período”. Isso porque, segundo ele também, quando o Ativo for maior do que o Passivo, o resultado será positivo (A > P = RP); e, quando o Passivo for maior do que o Ativo, o resultado será negativo (P  >  A = RN).

Observa-se, então, que todas as equações têm por base apurar o Resultado Econômico. Mas por que estamos diante de uma interpretação equivocada da equação da teoria matemática?

Acontece que Giovanni Rossi foi um dos continuadores das obras do também italiano Giuseppe Cerboni (1827-1917). Cerboni instituiu a “Teoria Personalista”, a qual dizia que a Contabilidade tem por base somente duas contas: a “conta do proprietário” (hoje, Balanço Patrimonial) e a “conta da agência” (hoje, Demonstrativo Econômico).

Giovanni Rossi utilizou a “Teoria Personalista” para defender a sua “Teoria Matemática”, dizendo que a diferença da “conta do proprietário” (Balanço Patrimonial) é a mesma diferença da “conta da agência” (Demonstrativo Econômico). Assim:

TEORIA MATEMÁTICA DAS PARTIDAS DOBRADAS
Débito
Crédito
Conta do Proprietário
a) Ativo
b) Passivo
Conta da Agência
a) Despesas
b) Receitas
Total a +a = 100%
Total b +b = 100%

Observa-se que a diferença entre o Ativo e o Passivo corresponde à diferença entre as despesas e receitas, e não à diferença entre o Ativo e o Passivo - recursos de terceiros, já que o Passivo é composto também pelos recursos pertencentes aos donos da pessoa jurídica, Patrimônio Líquido.

Por isso, na equação adotada por Giovanni Rossi (A – P = N), esse “N” chamado de “Líquido Patrimonial” não significa “Patrimônio Líquido”, mas “Resultado do Período” (lucro ou prejuízo), que, ao ser transferido para o Passivo, aumentará (lucro) ou diminuirá (prejuízo) as obrigações que a pessoa jurídica tem para com os seus donos, já que esses resultados pertencem a eles, e, assim, o Ativo passará a ser igual ao Passivo. Desta forma:

Conta do Proprietário
(Balanço Patrimonial)
Débito
Crédito


Ativo

Passivo
Conta da Agência
(Demonstrativo Econômico)
Despesas
Receitas
Débito
(-)
Crédito
(+)
Total ................................ 100%
Total ................................ 100%

Por isso, a Lei está absolutamente correta ao dizer que o Patrimônio Líquido é um subgrupo do Passivo, e não como o Conselho Federal de Contabilidade pretende ao afirmar que o Patrimônio Líquido é um grupo independente e que não representa, também, obrigações da pessoa jurídica.

4 de março de 2011

Qual a diferença entre ativo e despesas, uma vez que esses grupos são formados por contas devedoras?

“Débito” identifica as “coisas” que temos, as “coisas” que são nossas. Se temos um automóvel, podemos dizer “débito de automóvel”. Se temos dinheiro no banco, podemos dizer “débito de banco conta movimento”. Seguindo essa lógica, “cartão de débito” é um cartão que autoriza a pessoa a ter dinheiro no ato. Os grupos de ativo e despesas são formados por contas devedoras, porque é através desses grupos que estão registradas as “coisas” que temos. Temos “ativos” e temos “despesas”.

A diferença entre ativo e despesas está na “liquidez” das “coisas” que temos. “Liquidez” é a capacidade de transformar a “coisa” que temos (débito) em outra “coisa”; é a capacidade de vender a “coisa” que temos, de transferir a uma outra pessoa aquilo que temos.

Exemplificando:

- Temos um automóvel. Alguém quer comprá-lo? Alguém tem interesse em possuí-lo? Se a resposta for “sim”, esse “débito” é um ativo. Se a resposta for “não”, esse “débito” é uma despesa.

- Temos uma conta de luz. Alguém quer comprá-la? Podemos vendê-la? Alguém tem interesse em possuir essa conta? Se a resposta for “não”, esse “débito” é uma despesa. (Cuidado: Muitos gastos possuem a característica de despesa, mas representam um custo, um ativo.) Portanto, ativo são “coisas” que possuem “liquidez”, enquanto que despesas são “coisas” que não possuem.

O Conselho Federal de Contabilidade, através da Resolução nº 1.049/05, definiu “ativo”, nos seguintes termos: “a) O ativo compreende os bens, os direitos e as demais aplicações de recursos controlados pela entidade, capazes de gerar benefícios econômicos futuros, originados de eventos ocorridos”.

Com esse conceito, o CFC alterou a Lei. A Lei diz que ativos são formados por bens e direitos que têm liquidez (art. 178, § 1º da Lei 6.404/76). Assim, não podemos concordar com o conceito utilizado pelo CFC. Isso porque não precisa necessariamente ser nosso um bem para que o mesmo gere benefícios econômicos futuros. Podemos alugar esse bem ou arrendar, por exemplo. Então, esse conceito, s.m.j., não está compatível com os princípios contábeis e altera o conceito de ativo, e, por consequência, de patrimônio monetário.