11 de fevereiro de 2015

As empresas de auditoria multinacionais

O Ministério Público, em defesa da ordem jurídica e dos interesses da sociedade, precisa averiguar como as empresas de auditoria multinacionais atuam aqui no Brasil e se esta atuação é legal ou não. 

Vejamos: A PwC, empresa que audita a Petrobras, diz em seu site que não possui personalidade jurídica aqui. A PwC atua como as demais empresas multinacionais de auditoria, como uma network global de firmas separadas, utilizando-se de acordos operacionais com escritórios que possuem personalidades aqui, os quais, por sua vez, trabalham de forma independente, mas de forma integrada com ela.

Diante disso, alguns questionamentos se fazem necessários: 
- O contrato de auditoria que as empresas brasileiras firmam com estas empresas de auditoria multinacionais é um contrato de importação de serviços? 
- Quem recebe os honorários? 
- Para onde vão as informações apuradas e obtidas pelas auditorias? 
- Quem assume a responsabilidade civil e criminal pelas informações divulgadas nas demonstrações contábeis auditadas?
- Quem paga os escritórios brasileiros que prestam os serviços de auditoria para as empresas de auditorias multinacionais? 
- Como fica a relação de trabalho entre os profissionais dos escritórios brasileiros e os escritórios multinacionais? 
- Como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Conselho de Contabilidade fiscalizam estes trabalhos? 
- Como estas organizações multinacionais de auditoria recebem os seus registros profissionais para atuar aqui no Brasil?

As respostas para estas indagações são muito pertinentes devido à importância que representa uma auditoria, já que é através das demonstrações contábeis que as pessoas jurídicas realizam os seus negócios, e os resultados econômicos apurados pela Contabilidade deixam seus acionistas mais ricos ou mais pobres. 

Portanto, uma ação mais efetiva do Ministério Público no sentido de examinar e conhecer estes contratos para saber como tais empresas de auditoria multinacionais operam aqui no Brasil é extremamente importante e do interesse tanto do governo como dos brasileiros, mas, principalmente, dos profissionais contábeis que trabalham para estas organizações. 

O Conselho de Contabilidade deve prestar contas dos valores recebidos referentes ao Exame de Suficiência e outras atividades

A Lei nº 9.648, de 27/5/98, art. 58, tentou privatizar os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas. Dentro desta ideia de privatização, a organização, a estrutura e o funcionamento dos conselhos destas profissões seriam disciplinados pelo plenário do Conselho Federal; e o controle de das atividades financeiras e administrativas dos conselhos seria realizado pelos seus órgãos internos, devendo os conselhos regionais prestar contas ao Conselho Federal da profissão.

Ainda bem que nada disto se concretizou. Em 7/11/2002, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o referido artigo 58 e os parágrafos 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º são inconstitucionais, posto que a atividade de fiscalização do exercício profissional é estatal, nos termos dos arts. 5º, XIII; 21, XXIV; e 22, XIV, da Constituição Federal. Portanto, as entidades que exercem este controle têm função tipicamente pública, ou seja, possuem natureza jurídica de autarquia e estão sujeitas ao regime jurídico de direito público. Sendo assim, as suas atividades não podem ser delegadas a entidades privadas.

Já que as atividades do Conselho de Contabilidade não podem ser delegadas a terceiros, há certas perguntas que precisam ser respondidas: É o Conselho Federal, com o uso da estrutura dos conselhos regionais, que aplica o Exame de Suficiência? Se é o Conselho de Contabilidade que aplica o Exame de Suficiência, por que as taxas deste exame não são contabilizadas pelo órgão executor? Fazemos estas perguntas porque, de há muito, temos denunciado a falta de transparência nas contas dos conselhos de Contabilidade (nos âmbitos federal e estadual). 

Não são apenas as taxas de inscrição do Exame de Suficiência que não vêm sendo contabilizadas na contabilidade do Conselho, mas também as inscrições dos congressos, simpósios, seminários e de outros eventos promovidos e desenvolvidos tanto pelo Conselho Federal como pelos conselhos regionais. 

Se nós, contadores, defendemos a transparência nas contas públicas para proteger a sociedade, dificultando os desvios destes recursos para outros fins; tendo criado, inclusive, o “observatório social” para monitorar todas as compras e despesas com diárias e licitações, por que o Conselho não dá também exemplo, divulgando e dando transparência às suas contas? Afinal, é isso que determina a Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação).

Está mais do que na hora de haver mudanças no comportamento da entidade. Quais sejam: Primeiro, que sejam contabilizados na contabilidade do Conselho os recursos arrecadados com a realização do Exame de Suficiência e dos encontros de profissionais. Segundo, que órgãos como a Fundação Brasileira de Contabilidade, a Academia Brasileira de Ciências Contábeis e outras associações que recebem taxas de inscrições destes eventos prestem contas aos profissionais, a fim de que se saiba onde o total dos recursos arrecadados foi aplicado. Não é admissível que se use uma estrutura pública autárquica para realizar eventos cujas receitas acabem indo para outra entidade, sendo destinadas a outros fins que não os do próprio Conselho de Contabilidade.

Qual a diferença entre a OAB e o Conselho de Contabilidade?

Recentemente, recebemos uma solicitação para discorrer sobre a diferença entre a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB e o Conselho de Contabilidade em relação à defesa dos campos profissionais das duas categorias. 

A diferença entre a atuação das duas entidades é visível. A OAB age no sentido de exigir que o advogado seja respeitado no exercício de suas atividades. Em vários momentos, a entidade provou estar imbuída deste propósito, como no episódio em que o Ministro Joaquim Barbosa expulsou o advogado de José Genoino do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em junho deste ano. Em função deste ato, o Ministro recebeu uma nota de repúdio da OAB, publicada na imprensa. 

É assim que a Ordem atua, e é por isso que os advogados são respeitados na sociedade. Outro momento desta atuação ocorreu quando o art. 14 da Lei nº 12.016 tentou dispensar os serviços de advogados nas ações de Mandado de Segurança. A Ordem, então, ingressou com uma ação judicial, não permitindo que isto acontecesse. 

Já no caso do Conselho de Contabilidade, a atuação da entidade se dá de forma diversa. Dificilmente, o profissional contábil pode contar com a entidade no momento em que precisa de defesa em seu campo de trabalho. Vejamos um exemplo concreto disto: Um contador é contratado para executar perícia e acerta com o magistrado que os honorários serão pagos na entrega do trabalho. O magistrado não cumpre o acordo. O profissional, dentro do seu direito, protesta, indignado. O que o Conselho faz a respeito? Pune o profissional por infringir o código de ética da profissão ao haver protestado quanto à atitude do magistrado, alegando que o Contador foi agressivo e desrespeitoso com o magistrado. Nos perguntamos aqui o que leva o Conselho a valorizar um e a ignorar os direitos do outro? 

No campo profissional contábil, então, chega a ser hilário. Todos impõem obrigações, mas ninguém reclama positivamente. Mais grave ainda é ver o Conselho ratificar ações impostas arbitrariamente, como no caso da lei que manda o profissional contábil delatar o seu cliente caso haja indícios de lavagem de dinheiro, no exercício de suas funções. O Conselho de Contabilidade, em vez de protestar sobre a legalidade desta lei que atenta contra a privacidade profissional, aprova uma resolução que obriga o profissional a cumpri-la: a Resolução CFC 1.445/13.

Esta é a diferença entre as duas entidades: enquanto a OAB procura valorizar o advogado, o Conselho de Contabilidade se preocupa cada dia mais com ações de cunho social, programas de voluntariado, viagens para participar de encontros no exterior; e com a aprovação de resoluções que apenas confundem os profissionais na aplicação das técnicas. 

Em nossa opinião, muito pouco tem sido feito no sentido de valorizar a profissão contábil. Para isto, urge mudar a forma como o Conselho de Contabilidade é gerido.

10 de fevereiro de 2015

Resolução 1.255/09 do CFC gera insegurança jurídica ao classificar imóvel para locação em investimentos

A Resolução nº 1.255/09, seção 16, emitida pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), estabelece que a aquisição de terreno ou edifício (ou parte de um edifício, ou ambos) mantido pelo proprietário ou pelo arrendatário em arrendamento mercantil financeiro para auferir aluguéis e/ou para valorização do capital deve ser classificada como investimento. Esta classificação gera uma grande insegurança jurídica para os profissionais contábeis.

Vamos examinar a seguir o porquê disto: A classificação das contas do Ativo neste ou naquele grupo em uma estrutura de capital está definida na Lei 6.404/76, art. 179, alterada pelas leis 11.638/2007 e 11.941/2009. O inciso III do art. 179 da Lei 6.404/76 define como “investimentos” as participações permanentes em outras sociedades [ações e quotas de capital não destinadas à venda] e os direitos de qualquer natureza, não classificáveis no Ativo Circulante [ou seja, todos os ativos que irão permanecer com a pessoa jurídica em um prazo superior a 12 meses] e que não se destinem à manutenção da atividade da empresa. Já segundo o inciso IV do mesmo art. 179, para um ativo ser classificado como “imobilizado” este tem que ser corpóreo e destinado à manutenção das atividades da companhia ou da empresa ou exercido com esta finalidade, inclusive os decorrentes de operações que transfiram à companhia os benefícios, riscos e controle destes bens.

Observa-se que há no texto legal, em ambas as definições, um trecho que se refere à manutenção das atividades da empresa. É neste ponto que devemos nos ater quando estamos diante de um ativo corpóreo que irá permanecer com a empresa por mais de 12 meses, na hora de classificar se este bem faz parte do grupo de “investimentos” ou do “imobilizado”, pois o que diferencia uma conta da outra é justamente se o ativo se destina ou não à manutenção das atividades da empresa. Vamos, então, fazer a seguinte pergunta: Um ativo que tem por finalidade ser locado se destina à manutenção da atividade da empresa? Se a resposta for negativa, este ativo será um investimento; por outro lado, se a resposta for positiva, ele será classificado como imobilizado.

Mas o que se entende por “manutenção das atividades da empresa”? Manutenção das atividades da empresa é o conjunto de medidas e ações desenvolvidas para manter esta empresa em funcionamento. Estas atividades podem ser classificadas como econômicas ou não econômicas, lucrativas ou não lucrativas, empresariais ou não empresariais.

Cumpre registrar que o legislador não classificou que tipo de atividade a empresa deve executar; se a atividade é principal ou acessória, operacional ou não operacional. O que ele disse foi que todos os bens corpóreos destinados à manutenção das atividades da empresa devem ser classificados como imobilizado; e é exatamente em razão desta afirmação que o legislador estabeleceu que somente os imobilizados podem ser depreciados, porque são bens corpóreos colocados em operação, em uso, em atividades da empresa.

Assim, todo bem corpóreo será classificado como ativo imobilizado quando tiver por objetivo a produção de renda através de sua utilização ou for usado com esta finalidade. Porém, se o ativo é adquirido apenas para fins especulativos ou para valorização do capital, sem gerar atividade ou renda com a sua utilização, este ativo é classificado como investimento.

A omissão do Conselho Federal de Contabilidade no caso da Petrobras

O Conselho Federal de Contabilidade (CFC), órgão de defesa da profissão, está perdendo, mais uma vez, a oportunidade de mostrar para a sociedade o quanto a Contabilidade pode ajudar no combate à corrupção, por continuar indiferente e omisso diante de tudo o que vem acontecendo com a Petrobras.

É obrigação de quem vai executar um trabalho de auditoria avaliar os controles internos antes de iniciar os seus trabalhos. De acordo com os dirigentes do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria-Geral da União (CGU), os controles internos da Petrobras são ineficientes e não oferecem segurança quanto ao controle de sua movimentação financeira, econômica e operacional. Então, cabem aqui algumas indagações: A PricewaterhouseCoopers (PwC), auditora da Petrobras, ao iniciar a sua auditoria, examinou os controles internos? No caso de haver examinado, o que foi apurado e quem recebeu esta informação? A CVM tomou conhecimento disto?

O governo americano disse que a PwC americana notificou os auditores da sua franquia brasileira a respeito dos efeitos da investigação aberta nos Estados Unidos. E o governo brasileiro, o que fará a respeito? Não irá abrir investigação na PwC? É importante deixar registrado que o que está em jogo não é a Petrobras, a PwC ou a CVM. O que está em jogo é a importância de um trabalho contábil que o Conselho Federal de Contabilidade, enquanto órgão fiscalizador da profissão, tem a responsabilidade de averiguar, e, ainda, de verificar se as normas técnicas estão sendo observadas. Se houver algum desrespeito a esta importante atividade, isto precisa ser devidamente apurado.

O governo brasileiro e o CFC precisam examinar como estes escritórios de auditoria multinacionais funcionam aqui no Brasil. Por que eles não têm personalidade jurídica constituída aqui? Quem são os responsáveis técnicos contadores destas empresas de auditoria? 

Os contadores brasileiros não querem ver o seu Conselho ocupado com assuntos como o balanço socioambiental e social, com resoluções que confundem os profissionais na aplicação das técnicas, com viagens para o exterior para participar de encontros profissionais, com programas de voluntariado etc. 

O que os contadores desejam é ver o Conselho Federal participando dos problemas sociais, preocupado com a segurança dos recursos públicos, a transparência dos gastos, a independência da Contabilidade nos órgãos públicos; apresentando propostas para reforma nos tribunais de contas. Enfim, é isso que os contadores almejam: ver a Contabilidade a serviço da sociedade, auxiliando na proteção da riqueza nacional.

O que vem acontecendo com a Junta Comercial do RS?

Autor: Contador e Advogado Giovani Dagostim

A Junta Comercial é de relevante importância para o desenvolvimento econômico do Estado. Vale dizer que este órgão público, de competência do Estado, é o responsável pela legalização das empresas. 

As aberturas dos entes empresariais são arquivadas na Junta Comercial, assim como todos os demais atos de alterações das empresas e suas extinções. As empresas necessitam previamente obter o cadastro na Junta para, depois, dar sequência aos demais procedimentos que possibilitem a sua plena atividade. 

Entretanto, para nós, gaúchos, infelizmente, a Junta Comercial vem deixando muito a desejar. A morosidade, a insegurança e a burocracia descabida retardam a conclusão dos processos. Exemplo disto é que, após a aprovação dos registros, o setor que providencia os cadastros internos das empresas vem demorando mais de dez dias para concluir o serviço, o que impacta na demora, para as empresas, em obter o cadastro no ICMS, indispensável para a compra e venda de mercadorias. Acontece que a SEFAZ/RS, responsável pela administração do ICMS, se vale do cadastro informatizado da Junta Comercial para proceder a inscrição estadual. 

A ouvidoria da Junta Comercial não vem respondendo a contento as solicitações e reclamações dos usuários. Alguns servidores, para aprovar o instrumento empresarial, exigem o reconhecimento de firma, mesmo quando a norma que trata do assunto estabelece taxativamente ser dispensável tal conduta pelos empresários (Lei 8.934, art. 63). Ora, o servidor somente poderia exigir reconhecimento de firma em caso de fundado receio de que o empresário não fosse aquele indicado no preâmbulo. Neste caso, tal receio deveria constar taxativamente no motivo da exigência prolatada. 

A Junta Comercial deveria, ainda, dispor de regramento transparente sobre o prazo máximo para a conclusão do serviço de arquivamento dos atos, pois há muita instabilidade quanto ao tempo de demora. Outro fator que gera insegurança é a falta de padronização nos procedimentos a ser observados pelos vogais que analisam os processos.

Por último, registramos um fato concreto, que denota o ápice da burocracia sem qualquer sentido: Para constituir uma empresa, o usuário necessita fazer previamente um procedimento chamado “consulta de viabilidade”, que visa aprovar e reservar o nome a ser dado para a empresa. No caso, o nome dado  foi “X Participações Ltda”, o qual foi aprovado pela Junta Comercial. Concomitante ao encaminhamento do Contrato Social, o usuário necessitava juntar aos autos o requerimento para cadastro no CNPJ. O nome da empresa informado em tal requerimento foi “X Participacoes Ltda.” Destaca-se que o aplicativo do CNPJ não aceita cedilha e acentos ortográficos. Pois bem, ao tentar encaminhar os documentos para registro, a Junta negou a geração do requerimento sob o argumento de que o nome constante da viabilidade e do CNPJ divergiram. Inconformado, o usuário foi pessoalmente à Junta Comercial, onde lhe foi informado que a divergência que impedia a geração do requerimento não estava na cedilha ou no acento da palavra, mas, sim, no ponto existente após a abreviatura “Ltda”. Em face deste mísero ponto após a abreviatura do tipo jurídico “Ltda”, o servidor concedeu ao usuário duas alternativas: cancelar e fazer outra “consulta de viabilidade” ou refazer o requerimento do CNPJ. 

Essa conduta do Poder Público apenas reforça a tese de que se o Estado não entravasse a atividade econômica, certamente ele e o País seriam bem mais desenvolvidos.