14 de maio de 2010

O SPED e a intimidade do contribuinte

Você já deve ter ouvido falar que os empresários precisam manter a sua escrituração contábil em forma digital (ECD), e que essa escrituração é armazenada em um ambiente chamado Sistema Público de Escrituração Digital (SPED).

O SPED será administrado pela Secretaria da Receita Federal, com participação das administrações tributárias dos municípios, dos estados e do Distrito Federal, mediante convênio; bem como pelos órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta que tenham atribuição legal de regulamentar, normatizar, controlar e fiscalizar os empresários e as sociedades empresariais.

É importante salientar que a não apresentação da Escrituração Contábil Digital acarretará na aplicação de multa no valor de 5 mil reais por mês-calendário ou fração.

Algumas questões são levantadas, então: Por que os empresários devem ter os seus registros contábeis disponibilizados a terceiros sem a sua autorização prévia? Por que pagar multa por algo que não se deseja disponibilizar?

Disponibilizar as demonstrações contábeis não é a mesma coisa que disponibilizar os registros contábeis. Nos registros, estão assentadas todas as intimidades da gestão, em que consistem e como foram executadas. Assim, o sigilo empresarial evidenciado nos registros contábeis se constitui em elemento essencial à existência da empresa. Revelar fatos sigilosos sem autorização específica para isso, por autoridade legalmente constituída, e, ainda mais, divulgar assuntos não determinados, que merecem exame próprio, fere as normas de proteção do bem jurídico que é a empresa e a gestão empresarial.

Ter acesso às demonstrações contábeis é um direito da sociedade, para que ela saiba como se compõem os ativos, os passivos e os resultados das ações tomadas. A contabilidade revela como e de que forma esses resultados foram gerados. Ela expõe a sua "intimidade", ao passo que as demonstrações contábeis divulgam tão somente o saldo de suas contas, de suas ações.

Uma pessoa jurídica sem contabilidade não existe, pois não possui o essencial, o "corpo", que é representado pelas demonstrações contábeis, ficando inviabilizada, assim, a sua integração na sociedade.

Com efeito, disponibilizar no SPED a escrituração contábil, e os seus usuários terem acesso a este ambiente sem a autorização prévia da empresa, fere os artigos 1.190 e 1.191 do Código Civil, os quais dizem: "Ressalvados os casos previstos em lei, nenhuma autoridade, juiz ou tribunal, sob qualquer pretexto, poderá fazer ou ordenar diligência para verificar se o empresário ou a sociedade empresária observam, ou não, em seus livros e fichas, as formalidades prescritas em lei."; "O juiz só poderá autorizar a exibição integral dos livros e papéis de escrituração quando necessária para resolver questões relativas a sucessão,comunhão ou sociedade, administração ou gestão à conta de outrem, ou em caso de falência".

Da mesma forma, o artigo 47 da lei nº 8.981/95 possibilita ao empresário o arbitramento de seu lucro quando a pessoa jurídica, obrigada a tributar pelo Lucro Real, não possuir contabilidade e/ou Livro Razão. Assim, de acordo com essa lei, o empresário não seria obrigado a disponibilizar a sua contabilidade se ele optar pelo arbitramento do lucro de sua empresa.

Portanto, obrigar que a empresa divulgue a sua escrituração contábil em um ambiente que é administrado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, sem autorização prévia do empresário, e, ainda, aplicar multa de 5 mil reais por mês pela não disponibilização dessa escrituração, é ferir os princípios fundamentais no que diz respeito à sua intimidade e individualidade, contidos nos incisos X e XII da Constituição Federal.

12 de maio de 2010

O Livro Diário e o SPED

Recebemos diversas consultas nos questionando se o Livro Diário, com a entrada em vigor do SPED, deve ser emitido em papel.

Temos respondido que o Livro Diário é um documento obrigatório para dar validade aos procedimentos da gestão, nos termos do art. 1.184 do Código Civil.

O SPED (Sistema Público de Escrituração Digital) foi criado pelo Decreto-Federal nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007. Esse sistema unifica as atividades de recepção, validação, armazenamento e autenticação de livros e documentos que integram a escrituração comercial e fiscal dos empresários e das sociedades empresárias. Os usuários do SPED são a SRFB, as administrações tributárias dos estados e dos municípios e os órgãos e entidades da administração pública federal que tenham atribuições legais de regular, normatizar, controlar e fiscalizar os empresários e as sociedades empresárias. Portanto, nem todos têm acesso a esse expediente.

A Instrução Normativa da RFB nº 787, de 19 de novembro de 2007, que instituiu a Escrituração Contábil Digital (ECD), diz, em seu art. 1º, que essa exigência é somente para os fins fiscais e previdenciários. Disso conclui-se: a) que o SPED é obrigatório para algumas pessoas jurídicas (aquelas que apuram o seu Imposto de Renda pelo lucro real) classificadas como empresárias, ficando de fora dessa exigência as sociedades simples; e, b) que a ECD é para fins fiscais e previdenciários. Não contempla as finalidades societárias, jurídicas e todas as demais que necessitam das informações contábeis para tomarem as suas decisões.

Assim, concluímos que as pessoas jurídicas que depositarem a sua escrituração contábil no expediente SPED, e que vierem a necessitar das informações contábeis para outros fins que não os estabelecidos pela INRFB nº 787/07, deverão, assim que solicitado, apresentá-la em documento impresso, já que nem todos têm acesso a esse expediente. As pessoas jurídicas que não depositarem a Escrituração Digital no SPED deverão editar o Livro Diário em papel e requerer o seu registro ou autenticação na Junta Comercial ou no Cartório de Registro Civil da Pessoa Jurídica, cumprindo, assim, o que a Lei determina.