23 de novembro de 2011

Ainda sobre o aviso prévio proporcional

Recentemente, escrevemos um artigo para a imprensa intitulado “Aviso Prévio Proporcional”, em que dissemos que, de acordo com a Lei nº 12.506, sancionada em 11 de outubro p.p., o Aviso Prévio, em caso de rescisão sem justa causa do contrato de trabalho, passou a ser de 2,5 dias por mês trabalhado, e não mais fixo em 30 dias como era antes da Lei, para quem trabalhar até 12 meses em uma mesma empresa.

Em razão dessa interpretação, recebemos manifestações de alguns leitores dizendo que essa proporcionalidade dos 2,5 dias por mês trabalhado para quem tem menos de um ano de emprego na mesma empresa não poderia ser aplicada, uma vez que a Constituição veda Aviso Prévio com tempo menor do que os 30 dias.

É verdade. A Constituição Federal, em seu art. 7º, inciso XXI, estabelece que o Aviso Prévio será proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de 30 dias, nos termos da Lei. Assim, nos termos da Lei, coube à mesma regular a forma da aplicação da proporcionalidade. E foi exatamente o que a Lei 12.506 fez, determinando: “O aviso prévio, de que trata o Capítulo VI do Título IV da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, será concedido na proporção de 30 (trinta) dias aos empregados que contem até 1 (um) ano de serviço na mesma empresa.”

Observa-se, e foi por isso que chegamos àquela conclusão, que o mínimo de 30 dias estabelecido na Constituição tem relação com o tempo estabelecido no cálculo da proporcionalidade: “Aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias (...)”. A Lei 12.506, ao afirmar que o Aviso Prévio será concedido na proporção de 30 dias aos empregados que contem até um ano de serviço na mesma empresa, nos leva a concluir que esses 30 dias são em relação ao tempo de 12 meses. E é sobre esse parâmetro que se encontra a proporcionalidade. Então, o mínimo de 30 dias é para quem trabalhar 12 meses ou mais na mesma empresa.

A nova Lei poderia ter omitido essa proporcionalidade para quem conta até um ano de trabalho na mesma empresa, sendo clara e fixando os 30 dias para o Aviso Prévio neste caso em específico, mas o relator da Lei, pelo contrário, usa a expressão “na proporção de” para estabelecer uma proporcionalidade que não pode simplesmente ser ignorada pelo leitor da Lei.

Foi por isso, e é dentro desse contexto interpretativo que concluímos que o Aviso Prévio é proporcional ao tempo de serviço para os desligamentos sem justa causa dos contratos por prazo indeterminado até os 12 meses, perfazendo os 30 dias, conforme estabelece a Constituição. Após esse tempo, somam-se os 3 dias para cada ano trabalhado.

Nossas reflexões sobre essa questão têm o propósito de aprofundar a discussão sobre o assunto, e não de determinar taxativamente como se deve interpretar o texto da Lei. Além disso, como se trata de uma questão de interpretação controversa, certamente os órgãos legitimados sobre o assunto irão se manifestar, regulando a matéria, para, assim, orientar melhor os trabalhadores e empregadores, evitando uma sobrecarga de trabalhos no judiciário.

3 de novembro de 2011

A teoria do “débito e crédito” e a forma mercantil de escrituração

Publicado em Anais do I Seminário de Trabalhos Científicos em Contabilidade da UNISC. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 1999. p.37-56.

RESUMO: A técnica contábil, ratificada pelo Código Comercial Brasileiro (1850), determina que a escrituração contábil do Livro Diário deve obedecer à forma mercantil de registro. Forma mercantil de registro significa a observação do princípio das partidas dobradas: para cada “débito”, deve ser identificado um “crédito”, de forma simultânea, acontecimento por acontecimento. A identificação desordenada do “débito” e do “crédito” nos registros dos acontecimentos monetários no Livro Diário fere o princípio da forma mercantil de escrituração contábil.


CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente trabalho foi escrito em resposta a uma solicitação no sentido de que fosse elucidada uma questão referente ao modo pelo qual se executa a escrituração contábil de forma mercantil. Tal indagação foi trazida por um magistrado que precisava decidir sobre um processo que envolvia a escrituração contábil. Ao recorrer ao Código Comercial Brasileiro, descobriu-se apenas que o mesmo determina, em seu artigo 14, que a escrituração no Livro Diário deve ser feita de forma mercantil, sem elaborar definições sobre tal conceito.
Segundo o magistrado, não foi encontrada na literatura contábil qualquer informação que explicasse objetivamente como essa técnica de registro se processa.
Motivados por tal lacuna, procuramos tecer algumas considerações a respeito dessa técnica contábil, pois é a contabilidade, e não a lei, que deve dizer “como” e o que é ou não é a “forma mercantil” de processamento para o cumprimento da norma legal.
A contabilidade é uma ciência autônoma com objeto e princípios próprios, desenvolvendo funções próprias.
As ciências determinam o seu objeto de estudo, destacando-o dos demais fenômenos da natureza, ou, no caso, da sociedade, ao mesmo tempo em que, através dele, se determinam e configuram a si próprias, demarcando sólidas fronteiras.
O Patrimônio Monetário, como campo de estudos do contador, é isolado e sistematizado enquanto objeto de estudo, sendo que, por seu turno, é em função desse processo de “isolamento” e sistematização que se justifica a sua existência.
A técnica é a aplicação socialmente relevante daquilo que a ciência observa, estuda e comprova. Assim, as técnicas contábeis não nascem do arbítrio, elas nascem, em última instância, da natureza própria do campo de conhecimento que se define a partir do estudo do Patrimônio Monetário como seu objeto.
Na contabilidade, há dois elementos de estudo bastante diferenciados que compõem o conjunto de conhecimentos. Um diz respeito à formação e materialização das informações contábeis, o outro diz respeito ao estudo dessas informações.

A forma mercantil do processamento contábil é uma técnica adotada pela contabilidade para atingir um “objetivo”, que é a identificação da procedência, da origem de tudo aquilo que a pessoa possui. Depois de comprovada a sua finalidade pela ciência, ela se transforma num ato repetitivo. É por isso que é técnica.
A técnica é de domínio fechado e o seu procedimento visa a obtenção de um fim. A função técnica, portanto, é reiterativa, ou seja, ela sempre atua a partir de si mesma, sem lançar mão de recursos que lhe são alheios ou contar com a influência de fenômenos externos sobre o objeto de sua execução.
A contabilidade adotou como técnica para materializar as informações contábeis um procedimento próprio chamado de registro contábil.
Na terminologia contábil, denomina-se “registro” como “partida”. Quando se diz, por exemplo, que o sistema de registro contábil se baseia em “partidas dobradas”, estamos nos referindo à técnica do “débito e crédito”.
Segundo a maioria dos estudiosos, o frade Luca Paciolo se limitou a reproduzir os métodos das partidas dobradas que na época eram conhecidos e utilizados pelos comerciantes de Veneza.
Não nos deteremos em questões históricas neste trabalho, nem questionaremos a autoria da técnica. Tentaremos apenas examinar a referida teoria sobre os registros contábeis por “partidas dobradas” para chegarmos a uma definição do que seja “forma mercantil de registro” e o sentido atual do que seja “débito” e “crédito”.

Teoria do “débito” e “crédito”

Afirma o contador Américo Matheus Florentino, em sua obra Teoria e análise contábil, que:
A teoria personalística foi defendida por GIUSEPPE CERBONI e por GIOVANNI ROSSI. Também EDMOND DE GRANGES se filiou, sem o saber, à teoria personalística, porque a sua teoria das cinco contas gerais ordenava o débito ao comerciante ou à pessoa que recebia o valor.
Ora, o fundamento da teoria personalística é baseado em que, em qualquer empresa, existem apenas três grupos de pessoas:
a) a pessoa do proprietário ou as pessoas dos proprietários;
b) as pessoas que guardam valores do proprietário, isto é, os empregados da empresa;
c) as pessoas que lidam com a empresa, isto é, os seus clientes e fornecedores.
A teoria determina apenas que a pessoa que fornece algum valor deve ser creditada e a pessoa que recebe algum valor deve ser debitada.
Assim, quando o proprietário introduzia na empresa o seu capital social, era creditado. Quando João, o empregado Caixa, recebia dinheiro para guardar, era debitado. Quando Manuel, o encarregado do depósito das mercadorias, recebia mercadorias para guardar, era debitado. Quando um fornecedor entregava mercadorias à empresa, era creditado, e quando um cliente recebia mercadorias da empresa, era debitado.
A teoria em si admitia uma convenção sui generis: “debitar à pessoa que recebe e creditar à pessoa que entrega”. (1960, p.22-23) (Todos os grifos são nossos).
O contador Antonio Lopes de Sá, em seu artigo publicado na Revista do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul  intitulado “Uma hipótese sobre o aprendizado de Paciolo acerca das partidas dobradas”, assim diz:
2. O processo das partidas dobradas na obra de Paciolo
O processo de registros contábeis que se consagrou por uma “equação” ou igualdade entre o débito e o crédito, admite-se tenha surgido na Itália entre 1250 e 1280 d.C.
(...)
Federigo Melis admite que a intuição para o processo foi dos sumero-babilonos, mas que este só se consumou na Toscana, nos fins do século XIII d.C.
Que os sumero-babilônios conheciam o débito e o crédito, baseados no raciocínio de “meu” e “seu”, não há dúvida, como também não o há de que saldavam as contas e que extraíam balanços.
A obra de Paciolo é, basicamente, exclusivamente sobre as Partidas Dobradas, mas nenhuma referência histórica possui.
Apresenta, didaticamente, como “registrar” por tal processo, mas não entra no mérito das origens, dando a impressão nítida da exposição de um critério consumado. (1994, p.38-39) (Todos os grifos são nossos).
Já o professor francês J. Dumarchey, ao expor sua Teoria Positiva da Contabilidade, cuja versão foi elaborada por Guilherme Rosa, assim afirma:

Efectivamente, o problema da constituição das partidas dobradas apresenta-se assim: tornar extensiva a todas as contas a regra essencialmente própria das contas de pessoas, regra que é a de ser debitado quem recebe, e creditado quem entrega. Concluiu-se, muito naturalmente, que bastava para isso imaginarmos, na falta de pessoas reais, pessoas fictícias. Como, evidentemente, é possível darmos a estas caracteres arbitrários, parece, portanto, que basta escolher judiciosamente estes últimos, tendo-se em vista o fim que nos propomos alcançar.
Retomemos, pois, o exemplo da conta Mercadorias. Quando eu faço uma compra, a personagem Mercadorias é debitada, já que recebe, ao passo que o vendedor que entregou a fazenda é creditado pela importância convencionada.
Agora, eu vendo este produto por um preço superior. Isso não quer dizer que o valor do produto aumentou nesse intervalo, que entrou na conta um excedente de valor, pelo qual a personagem Mercadorias tenha de ser debitada, visto que recebeu? Mas, tal excedente não saiu, evidentemente, ex nihilo: resultou, antes, do serviço social prestado por nós, negociantes, que, por isso mesmo — visto que o fornecemos — devemos ser creditados, por intermédio duma nova personagem fictícia, na qual delegamos e que tem o nome de Lucros e Perdas. (1943, p.8) (Todos os grifos são nossos).
Os professores Francisco Valle e Armando Aloe, ao escreverem o livro Fra Luca Pacioli e seu tratado de escrituração de contas, assim relatam:

Não é nosso intuito discutir a vetusta teoria personalística das contas, nem o seu pretenso valor expositivo e  pedagógico, porém não vemos em tal passagem do “Tractatus” qualquer fundamento para se considerar aí a origem histórica da teoria da personificação das contas. Discordamos, todavia, da assertiva de ter quase quatro séculos de existência essa teoria e ter sido ela seguida sem controvérsia nem oposição durante esse período de tempo. Quando muito, pode considerar-se a sua origem na classificação das contas feita por De La Porte, em seu livro La science des nègociants, aparecido em 1738, da qual possivelmente se serviu Francesco Marchi para a sua classificação (1867), depois modificada e melhorada por Giuseppe Cerboni.
Também Angelo Chianale, em seus excelentes “Appunti di ragioneria generale” (Torino, Ano Acadêmico, 1953-54), diz que dessa explicação de Paciolo, ou melhor, de “l’ignoto compilatore di quel tratatto de’computi e delle scritture, accolto dal frate Luca Paciolo nella Suma de arithmetica”, surgiu a assim chamada “teoria pessoal das contas”, isto é, a suposição da existência de uma pessoa atrás de cada conta, teoria difundida por Lodovico Flori, em seu “Trattato del modo di tenere il libro doppio domestico”; e de tal modo apareceu o clássico postulado debitar quem recebe e creditar quem dá. (1964, p.24-25) (Todos os grifos são do autor).
Procuraremos, agora, exemplificar, expondo de forma mais simples e objetiva, essa teoria.
Essa nova explanação não nasceu do acaso e nem de estudos especiais no sentido especulativo. Ela se concatenou automaticamente pelas inúmeras vezes que fomos obrigados a superar as dificuldades para explicar aos alunos o que é “débito” e o que é “crédito”.
Vejamos como evolui o raciocínio nesta teoria. A exposição é simples e de fácil compreensão.
Primeiro, como foi dito antes, a contabilidade desenvolveu sua própria técnica de processamento mercantil. Essa técnica será abordada logo a seguir. Para que fosse dada sustentação ao processamento contábil, foi necessário adotar normas para identificar os acontecimentos que ocorrem no Patrimônio Monetário das pessoas.
Assim, padronizou-se que em todos os acontecimentos devemos identificar o que representa o “débito” e o que representa o “crédito”, nessa ordem, primeiro aquele, depois esse último.

Então, o que é "débito"?
"Débito" é tudo aquilo que a pessoa possui; é o que é seu, logo, "débito" equivale a "meu", a posse; se possuo um imóvel, por exemplo, posso dizer: "débito de imóvel".

E o que é crédito?
"Crédito" é a origem, responde como uma pessoa conseguiu aquilo que possui, aquilo que é seu. "Crédito" é a fonte, a procedência do débito. Se possuo algo, é por que o obtive de algum modo. O "crédito" responde como, de onde e por que conseguimos o que possuímos.

É por esse motivo que os registros contábeis obedecem às "partidas dobradas", porque tudo aquilo que é nosso veio de algum lugar, nós o obtivemos de alguma forma. Para melhor compreensão, apresentamos alguns exemplos práticos.

E x e m p l o s :

a) Acontecimento monetário:
Recebido máquina pela integralização de capital.
Identificação do débito:
Para identificar o "débito", devemos questionar, no acontecimento monetário, aquilo que nos pertence. Aquilo que é nosso. Se foi recebido máquina, logo, o que é nosso é a máquina. Portanto: DEBITA-SE MÁQUINA.
Identificação do crédito:
Para identificar o "crédito", devemos perguntar por que a empresa recebeu a máquina, qual a origem da máquina. Como no exercício a origem da máquina foi pela integralização do capital, logo, CREDITA-SE CAPITAL. 


b) Acontecimento monetário:
Compra de mercadorias a prazo.
Identificação do débito:
Para identificar o "débito" devemos saber o  que é nosso; o  que   nos pertence. Fazendo essa pergunta, concluímos que as mercadorias são o que nos pertence, portanto, DEBITAM-SE MERCADORIAS.
Identificação do crédito:
Para identificar o "crédito", devemos saber o porquê, de que modo conseguimos as mercadorias. Logo, verificamos que as mercadorias foram obtidas porque as compramos a prazo. Por isso, CREDITAM-SE CONTAS A PAGAR (FORNECEDORES).

c) Acontecimento monetário:
Pagamento de duplicatas com juros.
Identificação do débito:
Devemos saber, na operação acima, o que nos pertence. Assim, constataremos que ao pagar duplicatas com juros, nossos são a duplicata quitada, mais o comprovante de pagamento dos juros. Portanto, DEBITAM-SE DUPLICATA PAGA (FORNECEDORES) E JUROS PAGOS.
Identificação do crédito:
Para identificar o "crédito", devemos saber por que somos detentores das duplicatas pagas mais os juros. Dessa forma, concluímos que possuímos tais documentos porque entregamos por eles um cheque ou dinheiro correspondente ao seu valor. Logo, CREDITA-SE BANCO ou DINHEIRO (CAIXA).

d) Acontecimento monetário:
Recebimento da doação de um cão.
Identificação do débito:
Esta operação tem como resultado a transferência da posse de um animal. É ele que, pela doação, resultou sendo nosso na operação, portanto, DEBITA-SE CÃO.
Identificação do crédito:
Para identificar o crédito basta registrar qual foi o processo através do qual passamos a deter a posse do animal, porque ele agora é nosso, ou seja, através de uma doação, logo, CREDITA-SE DOAÇÃO RECEBIDA.

e) Acontecimento monetário:
Pagamento da conta de luz.
Identificação do débito:
Será necessário apenas indagarmos o que resultará nosso ao término desse acontecimento monetário. Após o pagamento da conta, nosso será o documento da conta de luz quitada, comprovando o cumprimento daquela obrigação. Assim, DEBITA-SE CONTA DE LUZ.
Identificação do crédito:
Para identificar o "crédito" nessa operação, basta trilharmos o mesmo raciocínio dos exemplos anteriores e fazermos a mesma questão: o que nos propiciou a possibilidade de termos em mãos a conta quitada? Logicamente, o seu pagamento, o qual poderá ter sido efetuado ou mediante um cheque ou com dinheiro (caixa). Portanto, CREDITA-SE DINHEIRO (CAIXA) ou CHEQUE.

f) Acontecimento monetário:
Pagamento de salário.
Identificação do débito:
Identificar o "débito" de um pagamento de salário é indagar o que será nosso após a realização do pagamento. O que adquirimos ao pagar o salário será o recibo do empregado comprovando o seu pagamento, assim, DEBITA-SE RECIBO DE SALÁRIO PAGO (SALÁRIOS).
Identificação do crédito:
O "crédito" da operação será o fator responsável pela aquisição, por nossa parte, do recibo de pagamento de salário. O que tornou nosso o recibo foi o dinheiro (ou cheque) que demos em sua troca, logo, CREDITA-SE DINHEIRO ou CHEQUE.

g) Acontecimento monetário:
Venda de mercadorias a prazo.
Identificação do débito:
Com a venda de mercadorias a prazo, passamos a  possuir valores os quais só serão recebidos posteriormente. Dessa forma, como consideramos "débito" aquilo que é nosso, nesta operação o "débito" serão os valores a serem recebidos, conseqüentemente, DEBITAM-SE VALORES A RECEBER.
Identificação do crédito:
A origem do nosso "débito" na operação, ou seja, o nosso "crédito" será a própria venda das mercadorias, que fez com que passássemos a adquirir os valores a receber mencionados acima. Logo, CREDITA-SE VENDA DE MERCADORIAS.

h) Acontecimento monetário:
Recebimento de duplicatas com juros.
Identificação do débito:
Ao recebermos o pagamento das duplicatas acrescidas de juros, passamos a ser possuidores de dinheiro (ou cheque). O "débito", como dissemos, é aquilo que é nosso, que possuímos, o que vem a ser o dinheiro pelo recebimento da duplicata. Portanto, DEBITA-SE DINHEIRO RECEBIDO (ou CHEQUE).
Identificação do crédito:
Como o "crédito" é a origem daquilo que passamos a adquirir, sendo esse referente a recebimento de duplicatas com juros, logo CREDITA-SE DUPLICATAS (DEVEDORES) E JUROS.

i) Acontecimento monetário:
Doação de mercadoria.
Identificação do débito:
O que passa a ser nosso quando fazemos uma doação é a  comprovação material da doação, ou seja, o recibo. Assim, o "débito" da operação, aquilo que, após ter sido concluída, passou a ser nosso, é o recibo da doação, logo, DEBITA-SE RECIBO DE DOAÇÃO.
Identificação do crédito:
A fonte, a razão pela qual agora somos detentores do "débito" "recibo de doação" será o "crédito" da operação, ou seja, a mercadoria doada. Dessa forma, CREDITA-SE MERCADORIA.

j) Acontecimento monetário:
Roubo de uma máquina.
Identificação do débito:
Com o roubo, e a conseqüente perda da máquina, pode parecer, à primeira vista, difícil considerarmos a ocorrência de algum "débito" neste acontecimento. Contudo, como todo o histórico da empresa, tudo aquilo que lhe acontece monetariamente deve ser registrado, será preciso identificarmos o "débito". O que nos pertence, o que podemos chamar de nosso após o furto, ou seja, nosso "débito" será apenas o registro de ocorrência do roubo. Assim, DEBITA-SE OCORRÊNCIA (DESPESA) DE ROUBO.
Identificação do crédito:
A origem do nosso "débito", ou seja, a razão pela qual agora "possuímos" o registro da ocorrência do roubo foi o próprio furto da máquina. Logo, CREDITA-SE MÁQUINA.

Conhecida a teoria do “débito” e do “crédito”, ou seja, após identificado o que é meu e de onde veio o “débito”, procuraremos, agora, expor a forma mercantil de escrituração contábil.


Forma mercantil de escrituração contábil

Registramos no nosso resumo que: a) forma mercantil de registro significa obedecer o princípio das partidas dobradas: para cada “débito” deve ser identificado um “crédito”, de forma simultânea, acontecimento por acontecimento; b) a identificação desordenada do “débito” e do “crédito” dos registros dos acontecimentos monetários no livro diário fere o princípio da forma mercantil de registros contábeis.
Por quê? Para que possamos sustentar essas afirmações, recorreremos ao criador (ou, pelo menos, seu maior divulgador no Ocidente) desta técnica, Frà Luca Pacioli, em seu tratado de escrituração de contas, parte integrante da Summa de arithmetica, geometria, proportioni et proportionalitá, publicada em Veneza, em 1494. Antes de iniciarmos nosso exame, reproduziremos o comentário dos professores Francisco Valle e Armando Aloe  a respeito da controversa identidade de Frà Luca:
Existem dúvidas quanto ao verdadeiro nome do famoso monge franciscano, posto que é grafado de numerosas formas pelos seus coevos e a própria assinatura de Fra Luca não coincide em sua forma gráfica nos vários documentos onde foi aposta pelo interessado. Parece que ele próprio não deu a mínima importância ao seu nome, o que demonstra ser despido de qualquer vaidade.
No frontispício da Suma, não aparece o nome do autor, mas no final da obra aparece escrito: “Irmão Lucas de Burgo Santo Sepúlcro, da Ordem dos Menores e humilde professor da sagrada teologia deu a lume este compêndio de aritmética, geometria, proporções e proporcionalidades com seu pouco engenho, por compaixão dos ignorantes.” O nome de Paciolo não é mais indicado na Summa, o que se explica pelo fato de ser o autor um religioso, que se assinava somente com as palavras Fra Luca, acrescentando-lhe simplesmente o lugar de seu nascimento, a ordem a que pertencia e a sua ocupação.
Como se vê, ele próprio não facilita a questão, mas complica-a, pois em “De Divina Proportione” (1509) aparece grafado Luca Patiolus e em alguns escritos assina-se Lucas Pacciolus. Em seu testamento, de 9 de novembro de 1508, diz-se frater Lucas bartolomei de patiolis de burgo sancti sepulcri, enquanto o notário Pedretti o chama fratem Lucam de Patiolis.
Ernest Ludwig Jäger (“Lucas Paccioli und Simon Stevin nebst einigem jüngeren Schriftstellern über Buchhaltung” – Stuttgart, 1876) o chama de Lucas de Burgo; Poullain, de Luca Cordilier; Bruneri, frà Lucio da Firenze; e Bianchini, frà Paolo Paciolo da S. Sepolcro. Cesar Cantu, em sua “História Universal”, nas ligeiras referências sobre o frade, chama-o Luca Paciolo e Francesco di Borgo Sansepolcro.
Angelo Riera (“Saggio sul Tractatus de Computis et Scripturis”, Siracusa, 1938) encontrou o cognome de Frà Luca grafado de diversas maneiras:  Paciuoli, Pacciuoli, Pacciuolo, Patiolo, Pacciolus, Paccioli, Lucha Matteo, etc.
Entretanto, de acordo com a opinião de Riera e de Federigo Melis, a grafia preferível é Pacioli, mais de acordo com a etimologia latina (Paciolis, Patiolis, Patiolus). Muitos escrevem Luca Paciolo, mas isto não é exato, como afirma Melis, pois na Toscana, região italiana onde se situa a sua cidade natal, dizia-se o Paciolo ou Luca Pacioli da mesma forma como se diz o Machiavello ou Nicoló Machiavelli, o Ferrucio ou Francesco Ferrucci. (1964, p.78-79)
É indiscutível a importância da técnica de registro contábil para as empresas, tanto que é considerada de grande valor expositivo e pedagógico. Essa técnica poderia perfeitamente ser, como afirma o professor Fernando Boter Mauri (1956), em seu livro Las doctrinas contables, também denominada de “doutrina jurídica”, pois é através dessa técnica que se conhece a evolução patrimonial das pessoas.
A forma mercantil de processamento ou a forma contábil de processamento é uma técnica adotada pela contabilidade para registrar todos os acontecimentos monetários que ocorrem em uma empresa. É uma técnica própria e exclusiva da contabilidade para viabilizar o estudo dos elementos que compõem o patrimônio das pessoas. Esses registros são materializados no Livro Diário para que o comerciante saiba de onde veio tudo aquilo que ele possui, e no Livro Razão para que se possam levantar os balanços e informações contábeis.
Assim, o registro contábil apontado no Livro Diário não é um mero registro mercantil realizado arbitrariamente e sem qualquer padronização técnica. É um registro que deve obedecer procedimentos e normas, porque é a partir dele que conhecemos de onde veio tudo aquilo que a pessoa possui.
A teoria do “débito e crédito”, como vimos, nos dá essa explicação, e a “teoria das contas” de Frà Luca disciplina e ordena os lançamentos. Assim, o processamento contábil obedece fundamentalmente à técnica das partidas dobradas.
Apesar de a teoria das partidas dobradas ser a base do processamento contábil, sendo que exatamente pela sua aplicação é que se iniciou o estudo da contabilidade, a muitos, ainda, ela apresenta sérias dificuldades quanto a sua compreensão.
Procuraremos simplificar a exposição da teoria para um melhor entendimento. Iniciaremos respondendo à questão: o que é processamento contábil. Em seguida, explanaremos como ele é realizado.
Então, processamento contábil é a transformação para uma linguagem técnica de um acontecimento monetário, pois tudo que acontece em uma empresa e que tenha valor monetário deve ser registrado pela contabilidade. Exemplo: o recebimento de uma doação, a compra de um automóvel, o pagamento da conta de luz. Ele se processa pela obediência à teoria das “partidas dobradas”. Isso quer dizer que o profissional tem que identificar em cada um dos lançamentos, em cada acontecimento monetário, o que é o “débito” e o que é o “crédito”. Nessa ordem, primeiramente identificar o "débito" para depois identificar o "crédito", simultaneamente. Não pode haver desordem nos lançamentos sob pena de haver a descaracterização do princípio mercantil de processamento. Princípio mercantil de processamento é a identificação simultânea de cada operação de “débito e crédito”.
Tomemos como exemplo o seguinte exemplo: somos contratados para responder a um questionamento para verificar se determinado fornecedor pagou o seu compromisso. O fornecedor, por sua vez, alega que a quitação apontada no título foi efetuada antecipadamente para que o “office-boy” pudesse receber a referida quantia. Só que a quantia não foi entregue ao “office-boy”, que ingenuamente deixou o título com o credor.
Outro caso pertinente seria a verificação do pagamento de uma determinada rescisão de contrato de trabalho. O funcionário alega que a rescisão havia sido assinada em branco quando da sua admissão.
Nós, contadores, para respondermos a indagações dessa natureza lançamos mão do Livro Diário. Nele, constata-se que ambos os pagamentos se encontram assentados a “débito”: um informando o pagamento do título e outro o pagamento da rescisão.
Ocorre que, hoje, por uma série de fatores, o processamento está sendo executado de forma desordenada. Ou seja, o “crédito”, que deveria informar como os “débitos” foram pagos, não obedece um padrão de simultaneidade com relação a esses. Os lançamentos são efetuados de forma desordenada, não obedecendo, assim, ao princípio das “partidas dobradas”: para cada “débito” deve-se gerar um “crédito”.
O que fazemos, então? Buscamos novas provas para constatar o efetivo pagamento, tornando, assim, secundários os registros contábeis, pois os registros que a empresa deveria manter para dar segurança a essas informações não lhes serviram.
É essa a razão pela qual, como vimos, o professor Fernando Boter Mauri (1959) afirmou que a teoria das “partidas dobradas” poderia, também, ser chamada de “doutrina jurídica”. Pois, com a contabilização respeitando a simultaneidade do “débito” e do “crédito”, saberíamos com precisão como os referidos “débitos” foram quitados, não havendo necessidade, assim, de se buscar outros meios de prova.
O Livro Diário não é um simples livro de assentamento de informações e nem pode ser entendido desse modo. Ele deve indicar com precisão como a empresa conseguiu aquilo que possui. Não fosse esse o sentido da existência de tal livro, não haveria a necessidade de se introduzir procedimentos técnicos de registro.
Procedimentos técnicos são padrões e normas que devem ser seguidos para que a ciência possa cumprir sua finalidade social e não fique restrita ao campo abstrato da especulação. A técnica, depois de consagrada a sua validade pela ciência, deve tornar-se uma rotina, um fato repetitivo. Não se pode alterar a técnica — seja para tornar os registros mais ágeis ou baratos, seja para permitir sua execução por leigos —, sem antes conquistar o aval da ciência, sob pena de se pôr em dúvida a própria razão de ser dessa última.
A técnica de registro contábil está sendo alterada pela perda da simultaneidade entre o “débito” e o “crédito” de cada acontecimento, o que leva a contabilidade, essa imprescindível  técnica de informação, ao descrédito junto à sociedade. Se chegamos ao ponto de que haja afirmações defendendo que qualquer um pode realizar os registros contábeis, isso é um sintoma de que os registros contábeis não estão sendo levados a sério.
A simultaneidade dos registros não é nenhuma novidade: ela é a base das informações contábeis. Ocorre que hoje ela está sendo desconsiderada por nossos sistemas informatizados de registro, na sua maioria elaborados por leigos, sem qualquer fiscalização ou autorização de uso por órgão da profissão. Os programas contábeis, ao invés de cumprirem com os princípios contábeis de processamento, visam somente os registros, esquecendo-se do resto. E, com isso, o Livro Diário, ao invés de cumprir com os princípios contábeis, apenas ordena as contas de acordo com o elenco de contas, não levando em consideração a ordem do “débito” e do “crédito”, transformando, assim, esses livros em peças inúteis para provar a evolução patrimonial das pessoas e tirando a identidade da contabilidade.
O processamento contábil deve ser encarado com seriedade. Nele, não pode haver dúvida. Se há um registro de pagamento, simultaneamente deve ser realizado um registro informando como o mesmo foi efetuado. Não pode existir dúvida num procedimento técnico. As pessoas devem poder confiar nos registros contábeis, pois é através deles que se estabelece a harmonia e a segurança dos “atos e fatos” empresariais. Existe um mundo lá fora que precisa dessa segurança para poder continuar funcionando. A contabilidade é de interesse público, pois toda a sociedade depende dela pelas informações econômicas, patrimoniais e financeiras que oferece. A contabilidade nasceu para ser a guardiã da riqueza de um país, e isso nós temos que preservar. E o Estado, por sua vez, deve oferecer aos contadores as condições necessárias ao exercício dessa função.

Informações históricas

Quando a escrituração contábil era efetuada manualmente, de um modo geral respeitava-se o princípio das partidas dobradas: após o “débito”, sempre lançava-se o “crédito”. Vejamos o que diz Frà Luca Pacioli em seu tratado:

Capítulo 11
Dos dois termos no dito diário usados máxime em Veneza, um denominado “por” e outro denominado “a”, e aquilo que por eles se deve indicar

Dois são, como se disse, os termos usados no dito Diário, um denominado POR, e outro denominado A, os quais têm o seu significado, cada um em particular. Pelo POR, sempre se indica o devedor, um ou mais que sejam, e por A se indica o credor, um ou mais que sejam. E nunca se coloca partida ordinária no Diário, que no Razão se há de transcrever, que não indique antes os dois mencionados termos, dos quais sempre no começo de qualquer partida se coloca o POR, porque primeiro se deve especificar o devedor, e depois imediatamente o seu credor, separado um do outro por duas aspas assim (), como no exemplo abaixo notarás.
1493, dia 8 novembro, em Veneza
Por caixa de contado  A Capital de mim, fulano de tal, etc. em dinheiro efetivo possuo daquela no presente, entre ouro e moedas, prata e cobre de diversos cunhos, como aparece no fólio do Inventário colocado em caixa, etc., em tudo ducados tantos de outro, e moedas de ducados tantos, valem em tudo, a nosso modo veneziano em ouro, isto é, a 24 soldos grandes por ducado e 32 soldos pequenos em liras de ouro (...)
Por gengibres selecionados a granel, ou em fardos  A açúcares de tal gênero... por fardos tantos... pesam libras tantas... obtive de fulano em permuta de açúcares efetuada nesta forma, isto é, que m’os colocou o C.º de açúcares a duc. 24, com isto me deu 1/3 em dinheiro... E colocado o C.º de gengibres duc. tantos por cento, por tais lhe contei açúcares pães n.º tantos... pesam libras tantas... que em dinheiro o C. º val. 20. E pelos ditos gengibres se tem libras tantas... pães tantos... valem cada um
Por gengibres selecionados por conta da permuta que obtive do tal  A açúcares... narrando tudo em seguida exatamente como acima.
Por Banco de Lipamani  A Caixa, por dinheiro efetivo que lhe coloquei contado, eu ou outros, que por ti o façam, neste dia, por minha conta, entre ouro e moeda... eu tudo duc.... val.
Por caixa  A Banco, ou “messer” Gerolamo Lipamani, dinheiro efetivo em tal dia, ou neste dia, retirado para minha necessidade... em tudo duc. tantos... val.
Por despesas do negócio  A Caixa em dinheiro, por barqueiros e portadores, manobradores e amarradores de tais cousas, em tudo duc. val.
Por despesas domésticas  A Caixa, que retirei para gastar a miúdo em um saquinho duc. tantos. val. (Valle e Aloe, 1964, p.117-121)
Pelos exemplos acima, extraídos da obra do autor do tratado de escrituração, observa-se que o processamento deve sempre obedecer à ordem de identificação no lançamento: o que se tem (débito) e de onde veio (crédito), nessa ordem.
O lançamento era simultâneo, identificando-se primeiro o “débito”, depois o “crédito”. Não havia “colunas” distintas no Livro Diário separando os elementos que compõem, em última instância, um mesmo acontecimento. Assim, a própria maneira como se procedia o registro, por si só, já identificava o que era “débito” e o que era “crédito”.
Por isto saberás que, de todas as partidas que tu tenhas feito no Diário, te convém fazer duas no Razão, isto é, uma no deve e outra no haver, porque ali se indica o devedor pelo POR e o credor pelo A, como acima dissemos, porque de um e de outro devem-se fazer por si uma partida, a do devedor por ao lado esquerdo e a do credor ao lado direito (do Tratado de Frà Luca, Capítulo 14).
A disposição espacial da anotação (devedor ao lado esquerdo e credor ao lado direito) não deve ser tomada como a essência do sistema de Paciolo. A idéia central ainda é a do registro como uma unidade. Ele apenas, ao ser transcrito, segue a ordem da identificação: primeiro o débito (à esquerda) e em seguida o crédito (à direita).
Nesse sentido, fica claro que os registros são as unidades que compõem o Livro Diário, e não os débitos e os créditos. Esses são as unidades que compõem os registros. Quem é registrado são os acontecimentos, dos quais identifica-se o “débito” e o “crédito”. Fora desse princípio técnico, descumprir-se-á o princípio das “partidas dobradas”, que corresponde à identificação simultânea, em cada lançamento, do “débito” e do “crédito”.


Conclusão

Como afirmamos no início, o objetivo deste trabalho é procurar esclarecer de uma forma mais simples os procedimentos que devem ser observados quando do processamento dos registros contábeis, preenchendo uma lacuna quanto à compreensão dessa importante técnica contábil e orientando profissionais e alunos da contabilidade, pois foi essa técnica que institucionalizou a contabilidade como um campo do saber.
A compreensão da essência daquilo que deveríamos fazer nos leva a detectar os problemas pelos quais a realidade se afasta dessa essência. Não podemos mais compreender a vida sem a informática. A complexidade do nosso mundo requer a velocidade e a concentração de espaço que ela nos proporciona. Contudo, nós deixamos que outros construíssem o futuro — que hoje é presente — de nossa profissão por nós. Nós permitimos que pessoas — bem intencionadas ou não — que desconhecem a essência da técnica contábil aqui exposta passassem a ditar as regras de como executar tais técnicas. Seja pela tentativa de tornar mais rápido nosso trabalho, seja na busca de construir um mercado para os profissionais da informática — são duas faces da moeda que não se excluem —, o fato é que se deturpou o caráter das técnicas contábeis a ponto de se usar o emprego da informática nas técnicas contábeis como justificativa da sua execução por leigos.
Pelo que temos observado, os sistemas eletrônicos, na sua maioria, não contemplam o princípio básico de processamento contábil, pois neles as informações registradas no Livro Diário não obedecem às normas de escrituração de contas, que determinam que a identificação do “débito” e do “crédito” deve ser realizada de forma simultânea.

A evolução tecnológica deve trazer vantagens ao usuário para simplificar a leitura das informações, indo, assim, ao encontro do objetivo da profissão, que é o estudo dos elementos que compõem o patrimônio monetário das pessoas.

Assim, sugerimos que o princípio das “partidas dobradas” no processamento contábil seja mais profundamente compreendido e amplamente difundido, e que o registro deve obedecer à forma mercantil de processamento, a qual requer a organização das diversas parcelas que compõem as contas em informações distintas para o “débito” e para o “crédito” (partidas dobradas), fazendo-se todos os lançamentos segundo um método que revele a origem de cada recebimento e de cada pagamento em ordem cronológica de dia, mês e ano.
É o que esperamos da profissão, para que assim se mantenha a sua estabilidade, dando, por conseqüência, segurança à riqueza nacional e às organizações produtivas.


Referências bibliográficas

DAGOSTIM, Salézio. A preservação do mercado de trabalho do contador e do técnico em contabilidade. Porto Alegre: edição do autor, 1997.
DUMARCHEY, J. Teoria Positiva da Contabilidade. Revista de Contabilidade e Comércio, Porto, 1943.
FLORENTINO, Américo Matheus. Teoria e análise contábil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1960.
MAURI, Fernando Boter. Las doctrinas contables. Barcelona, 1959.
SÁ, Antonio Lopes de. Uma hipótese sobre o aprendizado de Paciolo acerca das partidas dobradas. Revista do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n.76, jan./mar. 1994.
VALLE, Francisco; ALOE, Armando. Fra Luca Pacioli e seu tratado de escrituração de contas. São Paulo: Atlas, 1964.